terça-feira, 9 de dezembro de 2008

O modernismo e a Questão nacional

entrada do século XX no contexto internacional é marcada pelo desenvolvimento tecnológico científico e pelas transformações dos modos de vidas e das relações produtivas em quase todo globo. Inspirado pelo crescimento da ciência positivista essa nova “atmosfera” de progresso repercute sobre os diversos campos da atividade humana, tendo impacto na literatura, na política e na cultura.
O aceleramento da urbanização e o processo industrial fabril foram responsáveis de trazerem as primeiras concepções conceituais de modernidade, sendo este novo século, símbolo de uma nova era para humanidade. O entendimento do moderno correlacionou-se ao de progresso a de uma possível ruptura com o passado estático, quase sempre relacionado com atraso e desprezo, e o novo tempo “moderno” seria destinada pela dinâmica das relações produtivas que consubstanciada pela eletricidade movia uma nova época para os homens.
Entretanto apreciação conceitual de modernidade se esbarrou ao interpenetrar em outros campos da sociedade humana, como por exemplo, na cultura, pois romper com o passado cultural e histórico de uma sociedade não era tão fácil como trocar a forma de produção de uma economia agrícola para uma industrial fabril.
Dentro deste cenário histórico, o Brasil na sua primeira metade do século XX buscou absorver essa “atmosfera” de modernidade trazida principalmente pelos pensamentos das vanguardas européias. A idéia de uma nação como uma unidade nacional, sob os pontos de vista cultural, político e econômico vindo do velho continente europeu tinha grande aceitação no imaginário dos intelectuais brasileiros que enxergavam nestes pontos de vistas o alicerce que levaria o Brasil a se efetivar como uma nação “moderna”.
A concepção de modernismo brasileiro dentro de nossa historiografia atual acabou-se se associando quase como uma uníssona ao movimento da semana de arte moderna de 1922 ocorrido em são Paulo, tendo nomes como; Tarsila do Amaral, Mario de Andrade, Oswaldo de Andrade, Portinari, entre outros. Na verdade o texto da pesquisadora Monica Velloso vem de encontro a esta tendência “tradicional” de nossa historiografia, apontando a insurgência de movimentos modernistas brasileiros (plural) ocorridos em outras regiões nacionais, como a escola “modernista” de 1870 em Recife, e movimento boêmio dos intelectuais cariocas nas duas primeiras décadas deste século.
Portanto podemos dizer que as idéias de modernidade no Brasil foram construídas durante o final do século dezenove e início do vinte, sendo assim a acepção de modernismo brasileiro tem que ser entendida como um conjunto heterogêneo com as devidas distinções entre os movimentos e as épocas que citamos mais acima.
A escola modernista de Recife de 1870 sob a liderança de Tobias Barreto e tendo nomes como, Silvio Romero, Graça aranha, Capistrano de Abreu e Euclides da Cunha. Lançaram as primeiras concepções de modernismo para o Brasil, advindos da faculdade de direito do Recife, esses intelectuais pensavam num projeto que levaria a sociedade brasileira daquele fim de século enraizada de “aparentes problemas históricos” como a grande diversidade do povo brasileiro, de gênese: índios, brancos, negros e mestiços atrapalhavam a acepção de uma ”identidade” nacional necessária para o progresso de uma sociedade moderna “civilizada”, assim para o seu progresso o Brasil precisava romper com o seu antepassado histórico fundado numa sociedade miscigenada e de produção agrícola, para finalmente ter sua inclusão no mundo “moderno”.
A ótica destes primeiros intelectuais do modernismo brasileiro estava carregada dos conceitos das “cartilhas” evolucionistas do darwinismo social, onde insistiam possíveis diferenças de raças e civilizações, o Brasil pela sua característica histórica, sempre era visto como atrasado e inferior as nações européias e o seu progresso enquanto civilização estaria em eliminar ou romper com tudo aquilo que lhe colocava como “provável” entrave para o progresso e inclusão na era moderna. A miscigenação era visto como um fenômeno que tornou a sociedade brasileira “sem identidade” tendo elementos de varias modos de vidas distintas culturalmente, algo que era visto como perigoso, pois poderia causar um desequilíbrio na ordem social dos grupos étnicos a qualquer momento, impedindo o progresso ou estancando em seu desenvolvimento.
A solução pressuposta pelo movimento, a deplorável teoria do branqueamento pensada por esses intelectuais se concatenava com a idéia de “supremacia racial” onde a “raça” branca em cruzamentos com as demais raças se sobressaíra e perpetuaria o fim das demais “raças”, muitos quadros de pintores da época retratam a imagem de filhos de negros mestiços como brancos, incentivando o casamento inter-racial como projeto de modernidade, outro fator importante projetada por esse modernismo esta na diluição da cultura mestiça por uma cultura “erudita” advindos das vanguardas européias, assim a imigração de italianos, espanhóis e alemães para a plantação de café no sul do Brasil seria o inicio de um processo de europeização da cultura brasileira eliminando seus vínculos históricos coloniais.
Em linhas gerais o modernismo da escola 1870 de Recife lançou os primórdios da idéia de modernismo brasileiro, porém a concepção de modernidade ganhará características próprias a cada região em que desenvolveu um pensamento “moderno” criando assim uma pluralidade signos e símbolos. O modernismo carioca, por exemplo, se caracterizou bem distinto do qual vimos até aqui, seus intelectuais modernos representados pela classe “boêmia” da cidade se recusaram a aceitar as concepções trazidas pelas velhas guardas européias.
A decepção com a primeira república foi mais rapidamente assimilada pelos cidadãos da capital brasileira na época, sua população composta por estratos urbanos sentia que os direitos políticos conquistados pelo advento da república haviam ficado na mão de uma aristocracia rural cafeeira que defendiam os interesses de uma economia agrícola, estando longe de atender as necessidades demandas pela camada urbana carioca.
Essa amargura não se efetivou de forma melancólica, ao contrário, a linguagem satírica e humorística foi à principal forma de contestação deste movimento modernista brasileiro que se sentiam excluídos pelo sistema político vigente, se aliando com o popular em defesa da sua diversidade cultural. As charges e as caricaturas foram o principal meio de expressão deste movimento que ressaltava a importância das “trocas culturais” como um aliado para a modernidade, simbolizada através da luta por direitos trabalhistas e sociais e de uma possível “democracia racial”, vale-se ressaltar a influência da obra-prima de Gilberto Freire, casa grande & senzala, que modificou a concepção negativa da miscigenação não sendo mais encarado como algo perigoso ao ordenamento social.
O modernismo carioca que tinha nomes como, Lima Barreto, Bastos Tigres, Emilio de Menezes, entre outros, acabou elaborando um projeto onde se focava a necessidade de se conhecer o Brasil mais adentro, ou seja, as raízes culturais brasileiras, extraindo uma troca entre culturas regionais. Havia certa inversão a cultura estrangeira vista como aristocrata ligado aos poderosos que teriam desiludido a república dos intelectuias boêmios carioca, assim a modernismo estaria ligado a reconhecimento do popular e luta por direitos políticos e sociais da sociedade urbana excluída de seus interesses e não ligado a uma acepção de progresso movido pela cientificidade tecnológica da produção.
Contudo cabemos aqui dizer, que o sentido da pesquisadora Mônica Velloso ao abordar distintas concepções de modernismo existentes no Brasil, não foi de desmerecer ou desvalorizar o movimento da semana de arte moderna paulista ocorrido em 1922, mas sim de demonstrar que existiram outras concepções sobre modernidade, portanto é necessário ao se estudar este assunto elaborar uma trajetória histórica que passa da escola de 1870 de Recife e do modernismo carioca satírico até chegar aos famosos movimentos antropofágicos e do pau-brasil e o verde-amarelo da escola paulista.
Referência
Velloso, Monica pimenta, o modernismo e a questão nacional, pesquisadora da fundação Casa de Rui Barbosa

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