segunda-feira, 23 de junho de 2008

A história em Vico

O século XVIII é marcado pelo ressurgimento de idéias que focalizaram nas concepções antropológicas e racionais da realidade, assim tivemos uma ruptura com a visão teológica cristã que se perpetuava através de pensadores como; Tomás de Aquino e Santo Agostinho e todo conhecimento escolástico que se empregava através da junção da filosofia cristã e do pensamento aristotélico. Será exatamente neste enquadramento que teremos o crescimento das áreas de ciência como: matemática, física, mecânica entre outras que procuraram dar uma compreensão mais laica da realidade, focando-se principalmente por um racionalismo metodológico específico.
Neste contexto Giovanni Battista Vico oriundo da cidade Nápoles procurou de forma racional atacar e desconstruir uns dos principais pensadores desta linha racionalista que se expandia, Descartes. Sua crítica apesar de ser de forma extremamente argumentativa não foi muita aceita em sua época e somente mais tarde suas obras irão ganhar profunda importância e relevância principalmente nas recém denominadas ciências humanas.
Contundo ainda devemos salientar que ainda hoje, Vico é ainda muito reconhecido pelas suas criticas a descartes do que pelas suas concepções sobre a história e seu modo de enxerga as produções e as buscas das verdades sobre a realidade, o que se vê nitidamente que Vico é muito conhecido pelo seu anti-cartesianismo do que pela sua própria concepção gerada. No entanto feito nossa crítica a parte, vejamos um pouco da fundamentação de sua crítica e especificamente o que o mesmo propôs na concepção do conhecimento cientifico.
O racionalismo cartesiano baseado principalmente em ciências como a matemática e a física fomentou uma metodologia própria para a concepção de verdade e deu uma interpretação própria para a realidade. Extraindo de suas abrangências e de suas aplicabilidades a concepção que todo o conhecimento passível de existir passaria por uma acepção de idéia clara e distinta, para ratificarmos nossa argumentação colocaremos a exposição do que seria este paradigma cartesiano através de Isaiah Berlin[1];

“ De Acordo com a escola cartesiana, o paradigma do verdadeiro conhecimento consistia em partir de verdades tão claras e tão distintas que somente podiam ser contestadas a custa de cair no absurdo, e dali prosseguir até chegar, através de normas estritamente dedutivas, a conclusões cuja autenticidade estava garantida pelas infringíveis regras da dedução e transformação, mediante as quais, como acontece na matemática, tais deduções derivam das suas intocáveis e eternamente verdadeiras premissas.”( Berlin, Pg: 26 e27)

O que se perpetuava através destas acepções cartesianas era que todo o conhecimento só existiria se o mesmo fosse passível de ser deduzido em expressões matemática ou físicas, e que mesmo que não tivessem a forma numérica dessas expressões teriam que alcançar o mesmo nível de exatidão para serem passiveis de analogia e de verdades.
Vico será o primeiro a questionar estes argumentos cartesianos, que para aquelas áreas que não concebiam a mesma exatidão se fosse considerado como mero passatempo ou divertimento do qual não mereciam tratamento cientifico. A contra resposta de Vico além de ser de tamanha inteligibilidade, ela foi toda fomentada através de premissas e deduções lógicas que, diga-se de passagem, foi uma ironia a parte, pois usou a própria arma do inimigo para desconstruí-lo.
Baseando-se principalmente em provar que o conhecimento matemático e físico só foi capaz de criar concepções que somente pode ser possível de aplicabilidade somente nas suas áreas, no qual em outras palavras não poderia servir de modelos para comparação de outros tipos de verdades, argumentou que o conhecimento só pode ser concebido como claro e distinto à medida que o mesmo conceber e formular suas próprias acepções.
Assim teremos na geometria, por exemplo, o próprio matemático que cria as condições de existências de um triangulo e tendo assim feito poderá ter a compreensão por completo de sua textualidade. Vico chamará esse tipo de conhecimento de per causas, um tipo de conhecimento que se baseia num conhecimento escolástico, do qual só é possível ter a noção completa de algo quando se cria o mesmo objeto, assim numa visão teológica cristã só o próprio Deus poderia ter a concepção mais concreta de tudo que existir, pois na medida em que o próprio criou este teria ciência de suas matérias e seus sentidos de existência. Contudo para deixar mais nítida nossa colocação, ratificamos através da seguinte argumentação de isaiah Berlin[2];

“ O ponto de vista de que o conhecimento per causas é superior a qualquer outro, é uma velha idéia freqüentemente baseada na filosofia escolástica. Segundo ele, Deus conhece o mundo por tê-lo feito de forma e por motivos que somente ele conhece, e nós não podemos conhecê-lo em sentido mais completo porque não o fizemos- o encontramos já feitos e nos é dado como um “fato natural”. Para o criador de uma coisa, particularmente se, como no caso de Deus, além de criar o artefato, também criou o material do qual o construiu e, ainda, inventou as regras para construí-lo, nada pode, em principio, ser opaco. “ ( Berlin, pg; 29)

Este tipo de conhecimento está mais evidente em áreas como a matemática, entretanto Vico rejeita a total certeza e absoluto deste conhecimento, pois apesar de trabalharem com mais conhecimento do tipo per causa, ou seja, aquele do qual se tem um objeto de estudo no qual o própria cria, como um triângulo, por exemplo, no entanto Vico ressalta que nem todos os conhecimentos matemáticos estão edificados por este principio, existindo assim lacunas do qual o objeto de estudo já é pré-concebido.
Lógico que dentro da matemática este tipo de conhecimento do qual o objeto de estudo já é pré-concebido é bem menor que, por exemplo, nas áreas que estudam as atividades humanas, no qual podemos classificar que seus estudos já partem de uma realidade pré- existentes e, portanto será necessário criar uma nova metodologia pra esse tipo de conhecimento, pois os princípios cartesianos que se baseiam em expressões matemáticas são incompatíveis devido a seus diferentes níveis de conhecimento per causas.
Assim diferentemente de Descartes que crítica, por exemplo, a história de forma extremamente dura, chegando a comparar que o conhecimento que um historiador tinha de Roma e comparável a da empregada de Titio Lívio, Forçando uma argumentação autoritária de supervalorizar uma área e de ridicularizar a outra. Diferentemente de Descartes, Vico reconhecerá a importância e cientificidade da matemática, entretanto ressaltará também a importância dos conhecimentos humanos e históricos, pois seu objeto de estudo se trata nada menos do que todo o espírito humano que através de suas ações gerara todas as formas de linguagens, governos, leis e filosofias.
Procurando entender este espírito e sendo também parte dela que o conhecimento humano teria que partir para uma abordagem que abrangesse a influencias de seus processos numa gama de heranças de suas civilizações e criações, criando através de concepção da idéia de verum-factum, no qual Collingwood[3] nos explana;

“ Conclui-se do principio do verrum- factum que a história – que é algo feito enfaticamente pelo espírito humano- está especialmente apta a ser objecto de conhecimento humano. Vico considera o processo histórico com um processo, através do qual os seres humanos elaboram sistemas de linguagem, costumes, leis, governos, etc. isto é , considera a história como a história da gênese e do desenvolvimento das sociedades humanas e das suas instituições. ( Collingwood, pg: 89)

Esta concepção para o conhecimento humano traz em si um principio inovador estrondoso, pois foi através deste principio que se fomentou uma unicidade comum (o espírito humano) de objeto de analise, portanto se rompeu diretamente com as abordagens históricas como a grega ou a romana, no qual suas abordagens se particularizavam em entender as causas somente em seu contexto e não fazendo assim analogias com outros povos, no qual dentro dessas visões não existia esse elo ou esse espírito humano do qual se poderia transporta de uma época para outra, pois teriam segundo Vico a mais essência e a mesma forma.
Portanto Vico contribui dando aos historiadores uma poderosa arma de analise que avaliando em nível de limites cronológico podem ser facilmente aplicado por um historiador hábil, que usando essa unidade comum que é espírito humano no qual Vico classificou, se é possível criar pontes explicando determinadas situações através de outras que tenham características em comum, e isto decorre independentemente de se tratar de civilizações ou nações diferentes.
Esta concepção de mostrar que existem períodos que apresenta características semelhantes em lugares distintos e cronologias diferentes fez Vico avançar diretamente e se encaixar como um teórico que irá formular uma teoria sobre a história, criando assim um direcionamento para essas ações, ou melhor, um sentido que as regesse.
Para Vico essas ações se constituíam através de períodos comuns que se propagam através de inversões periódicas, assim termos ora um heroísmo, ou ora um classicismo, ora uma fase agrícola, ou ora uma fase industrial, como nós é muito bem explicado por Collingwood[4];

“Em segundo lugar, Vico mostrou que estes períodos semelhantes tendiam a repetir-se periodicamente, com a mesma ordem. Cada período heróico é seguido por período clássico, em que o raciocínio prevalece sobre a imaginação, a prosa sobre a poesia, a indústria sobre a agricultura, e a moral baseada na paz sobre a moral baseada na guerra” (Collingwood, pg;92)

Entretanto apesar de apontar semelhanças entre períodos e de certa unidade comum, pois todos foram feitos pela a ação humana, Vico não caiu na velha tradição grega cíclica e nem na estática linearidade oriunda das acepções cristã, pois apesar de enxergar períodos semelhantes, estes não se repetem de forma idêntica ao que já tinha concebido, mais sim de uma nova relação configurado em novo contexto e nova realidade a ser analisada, portanto viu nitidamente a singularidade presente aos acontecimentos humanos de forma a elaborar uma visão espiral para este movimento do qual a história se decorria. Para deixar mais exposto colocaremos uma ratificação de Collingwood sobre isto;

“Em terceiro lugar, este movimento cíclico não é mero rotativismo da história, através dum ciclo de fases fixas. Não é um circulo, mas uma espiral, pois a história nunca se repete, atingindo cada nova fase, numa forma diferenciada em relação ao que antecedeu.” (Collingwood, pg; 92)

Contudo, quando foi possível Vico não foi somente um grande crítico e fundador da corrente anti-cartesiana dentro do conhecimento filosófico e cientifico, mais também uns dos grandes idealizador de concepções sobre as ciências humanas, que até sua existência não tinham seus status de ciência reconhecido no meio acadêmico e cientifico, além de formular acepções sobre o sentido e regimento do conhecimento histórico, por fim podemos dizer que Vico será o criador do principio de uma ciência nova, não formada agora somente nas expressões matemática e nas idéias claras e distintas, mas também oriunda dessa busca pela compreensão do espírito humano, dando daí o surgimento e a gênese das ciências humanas e sua forma mais nítida.

Bibliografia

Collingwood, R.G, A idéia da história, editorial presença/ Martins fontes, s/d, Lisboa Portuga.

Berlin, Isaiah. Vico e Herder, trad. De Juan Antônio Gili Sobrinho. Brasília, editora universidade d Brasília, 1982.

[1] Berlin, Isaiah. Vico e Herder, trad. De Juan Antônio Gili Sobrinho. Brasília, editora universidade d Brasília, 1982.

[2] Berlin, Isaiah. Vico e Herder, trad. De Juan Antônio Gili Sobrinho. Brasília, editora universidade d Brasília, 1982.

[3] Collingwood, R.G, A idéia da história, editorial presença/ Martins fontes, s/d, Lisboa Portuga.

[4] Collingwood, R.G, A idéia da história, editorial presença/ Martins fontes, s/d, Lisboa Portuga.

Um comentário:

ALMAVIVA disse...

Fazer correção ortográfica!!!